A vaidade humana e a ciranda de pedra da Veneza brasileira

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Por Valter Nogueira

Recife, conhecida como a Veneza brasileira, parece querer se transformar na Ciranda de Pedra, a partir da surreal iniciativa do Tribunal de Justiça de Pernambuco com vista a imortalizar seus desembargadores com estátuas erguidas na lateral do Palácio da Justiça. Assim como na obra de Lygia Fagundes Teles (Ciranda de Pedra), o espaço celebratório do TJPE pode, talvez, tornar público as características psicológicas – ou psicodélicas – de seus magistrados.

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Tudo isso acontece em meio a repercussão negativa que levou o TJPE a desistir, recentemente, de outra “grande” obra voltada à vaidade: a construção da “Calçada da Fama” para homenagear os presidentes da mais alta corte do Poder Judiciário pernambucano.

Vale destacar que nos edifícios sedes de tribunais é comum encontrar um salão com fotos dos ex-presidentes, denominados Galeria de Presidentes. Mas, parece que não basta a exibição em ambiente interno; a valorização à própria aparência precisa ganhar às ruas.

Neste auto exposição, é possível que alguns dos magistrados retratados nas esculturas já tenham até dado pitacos, por assim dizer, ao escultor quando da feitura da obra, com recomendação de retoques narcisistas. A ideia é parecer melhor na foto – ou melhor, na obra – do que na vida real.

Obra mais original se encontra na Dinamarca, com assinatura dos artistas Jens Galschiøt e Lars Calmar. Denominada “Sobrevivência do mais Gordo” (Survival of the Fattest), a estátua, feita em bronze, com 3,5m de altura, retrata uma mulher gorda, sentada nas costas de um homem magro. Na sua base há a seguinte inscrição: “Estou sentada nas costas de um homem. Ele está afundando sob o fardo. Eu faria qualquer coisa para ajudá-lo. Menos descer de suas costas”.

Calçada da Fama

No rol da vaidade e na galeria do culto à imagem, o presidente do TJPE, desembargador Ricardo Paes Barreto, havia anunciado a “Calçada da Fama”, durante um programa de TV, no último sábado, dia 20 de abril do ano em curso.

A “Calçada da Fama” seria construída para homenagear os presidentes daquele Tribunal. Em entrevista concedida à imprensa, nesta quarta-feira (24), e após repercussão negativa, Ricardo Paes voltou atrás e disse que “há muito a ideia foi afastada”.

Redes Sociais

A notícia viralizou nas redes sociais, como se diz hoje em dia. No entanto, de forma negativa. com chacotas de toda sorte.

Afronta

Em um país onde milhares de pessoas estão desempregadas, e outro tanto se amontoam em filas em busca de emprego que pague, ao menos, o salário-mínimo, eis que o Poder Judiciário de Pernambuco esbanja riqueza, jogando dinheiro fora em culto a própria imagem.

Outrora, os barões do café, em exibição de poder econômico, queimavam, literalmente, nosso papel moeda ao acender seus cigarros com notas de mil réis. Agora, no tempo moderno, os coronéis pernambucanos de toga trituram o nosso dinheiro, transformando-o em argamassa para moldar suas vaidades.

Valter Nogueira
Valter Nogueira
Valter Nogueira de Amorim, jornalista profissional, é o editor-chefe do blog. Formado em Comunicação Social pela Universidade Federal da Paraíba (1988). Atuou nos principais jornais impressos do Estado, tais como A União, O Momento, Correio da Paraíba e O Norte. No campo administrativo, foi secretário de Comunicação da Prefeitura Municipal de Santa Rita (1997-2005), assessor de Imprensa da Prefeitura de Pedras de Fogo (2008). Exerceu, também, o cargo de gerente de Comunicação do Tribunal de Justiça da Paraíba, no período de fevereiro de 2015 a janeiro de 2019.

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